Entre salários e dívidas: questões sobre a (im)penhorabilidade da remuneração

Nos termos do artigo 833 do Código de Processo Civil (CPC) de 2015, a regra geral da impenhorabilidade de salários pode ser excepcionada quando for para o pagamento de prestação alimentícia, de qualquer origem, independentemente do valor da verba remuneratória; e para o pagamento de qualquer outra dívida não alimentar, quando os valores recebidos pelo executado forem superiores a 50 salários mínimos mensais.

Segundo o ministro Luis Felipe Salomão, o legislador, com o objetivo de preservar o patrimônio mínimo indispensável à sobrevivência digna do executado, limitou a tutela executiva ao garantir a impenhorabilidade da renda de natureza alimentar. Ao mesmo tempo, previu, na própria norma, exceções autorizadoras da penhora, “que refletem a não menos relevante preocupação com a dignidade da pessoa do exequente quando o crédito pleiteado envolve seu próprio sustento e o de sua família”.

O magistrado observou que a maioria dos países civilizados estabelece que os salários de alto valor podem ser parcialmente penhorados sem sacrifício de digna subsistência do devedor. “Nesse passo, vem o STJ tentando estabelecer um norte a guiar as mais diversas situações em que se deva autorizar, de forma excepcional, a penhora dos vencimentos (ou verba equivalente) do devedor”, ressaltou.

Flexibilizaç​​ão

Salomão lembrou que o tribunal – em casos envolvendo o CPC de 1973, que estabelecia exceção à regra apenas nos casos de pagamento de prestação alimentícia – se posicionou no sentido de que as sobras salariais podem ser objeto de constrição (EREsp 1.330.567), bem como admitiu a flexibilização quando a verba remuneratória (em sentido amplo) alcançasse montante considerável (REsp 1.514.931).

De acordo com o magistrado, a jurisprudência do STJ sempre foi firme no entendimento de que a impenhorabilidade de tais rubricas salariais só cederia espaço para situações que envolvessem crédito de natureza alimentar. No entanto, observou que, por construção jurisprudencial, as turmas integrantes da Segunda Seção também estenderam a flexibilização a situações em que haja expressa autorização de desconto, pelo devedor, de empréstimos consignados.

“Destaca-se, nessa hipótese, que não se trata efetivamente de uma exceção à impenhorabilidade, já que, em verdade, penhora não há; ocorre, sim, uma disponibilização voluntária, pelo devedor, de parte de seus vencimentos, tendo ele renunciado espontaneamente à proteção preconizada”, afirmou.

Manutenção da dignid​​ade

Em outubro de 2018, a Corte Especial, no julgamento do EREsp 1.582.475, reconheceu divergência entre as turmas integrantes da Primeira Seção – que só admitiam a penhora das verbas previstas no artigo 649, IV, do CPC/1973 nos casos de crédito de natureza alimentar – e as turmas integrantes da Segunda Seção – que, num viés mais abrangente, permitiram a penhora em casos de empréstimo consignado e em situações nas quais a constrição parcial não acarretasse prejuízo à dignidade e à subsistência do devedor e de sua família.

Naquela oportunidade, o colegiado definiu que a regra legal comporta, para além da exceção explícita, a possibilidade de reconhecimento de outras exceções à impenhorabilidade da verba remuneratória.

FONTE: STJ

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